Xisto Vieira, presidente da Abraget
Foto: Abraget/Divulgação
Segurança Energética

O SISTEMA ELÉTRICO DA LAPÔNIA

Em artigo, presidente da Abraget reflete sobre ataques à geração térmica

Xisto Vieira
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Já virou rotina. Todos os dias, quando acordamos, logo depois do café da manhã, somos brindados por um ou mais artigos atacando, geralmente com fúria, as usinas termelétricas do nosso Sistema Interligado Nacional (SIN).

Então, pensamos: “puxa vida, o que será isto? Um “fanatismo verde” descabido, sem se importar com o consumidor? Um monte de colocações absurdas, visto que a nossa matriz elétrica já é 90% renovável? Incapacidade técnica na área de sistemas elétricos de potência, tão esquecida pelas opiniões e “achologias” moderninhas? Algum outro interesse mais difícil de identificar? Ou seria a soma de todos esses fatores?

Vamos aos fatos:

 

1) Um articulista coloca que é “fundamental a introdução de baterias para substituírem geração termelétrica, porque são 30% mais baratas”.

Engraçado é que este articulista é a mesma pessoa que coordenou um trabalho para a Abraget (Associação Brasileira de Geradoras Termelétricas) que concluiu pela necessidade imediata, já em 2018, de 6.000 MW de geração termelétrica no SIN. Imagina agora!

E de qual cartola mágica ele tirou que as baterias seriam 30% mais baratas? Comparou, inclusive, laranja com paralelepípedo, pois esses equipamentos têm atributos totalmente diferentes. Pela milésima vez, lembramos que confiabilidade não é só durante o horário de ponta de carga, é o dia inteiro.

 

2) Quem não se lembra do inacreditável estudo de um organismo de outro país, naturalmente executado por juvenis, e que foi patrocinado por algum organismo do “patropi”, que “demostrava” que o nosso sistema já poderia operar com 100% de fontes renováveis.

Que interessante, um estudo que desafia o mundo todo. Claro que se trata de algo extremamente sem nexo e sem noção. Nós temos estudos sérios de dinâmica de sistemas de potência que mostram que, a partir de 30% de nível de penetração de renováveis, já poderão ocorrer problemas no sistema, se não houver respaldo de máquinas síncronas no SIN (usinas termelétricas). Então, vejam só a inconsequência de promover um estudo dessa natureza, que obviamente não foi a frente, graças ao bom senso do MME (Ministério de Minas e Energia) de não deixar evoluir um trabalho totalmente equivocado.

 

"Pela milésima vez, lembramos que confiabilidade não é só durante o horário de ponta de carga, é o dia inteiro."

Xisto Vieira

Presidente da Abraget

 

3) Praticamente esses mesmos atores já promoveram reuniões de “defesa de baterias” para um leilão de confiabilidade, mas não conseguiram responder a simples perguntas envolvendo segurança de sistemas elétricos. Claro, não são técnicos da área de sistemas elétricos de potência e, em sua maioria, desconhecem rudimentos deste tipo de sistema.

E que fique bem claro, não somos contra a baterias, em hipótese alguma, e achamos que elas têm e terão muita serventia nos sistemas elétricos. Mas não na segurança elétrica e energética do SIN. As máquinas síncronas são imbatíveis em termos de segurança e resiliência.

 

4) Agora, um outro time do nosso querido setor acaba de descobrir um novo substituto para a geração termelétrica: a Resposta Voluntária da Demanda (RVD). Essa é sensacional: os fanáticos verdes preferem cortes de carga (mini racionamentos) do que gerar termelétrica.

Mas aí, passa da conta! Poderíamos falar bastante sobre esta medida, mas vamos resumir: primeiramente, tal medida só é aplicável a consumidores industriais, que se oferecem para serem cortados quando o preço oferecido para o corte é maior do que o seu custo de produção. Então, ou este consumidor está fazendo “gaming” tendo comprado um “plus” de energia mais barata e se oferecendo a vender por mais, ou realmente o seu custo de produção é muito alto, e então vira um problema de ordem econômica para o governo analisar. E mais, essa medida traz “ganhos financeiros” que são muito difíceis de chegarem a Seu João e a Dona Maria, estes sim, os consumidores cativos que teriam que ter direito a tais ganhos, eventualmente.

Trata-se de uma medida desestruturante, portanto, no sentido que jamais um corte de carga poderá substituir uma geração em condições normais. Em emergências, isto é plenamente justificável, e aqui temos instalado um sistema chamado ERAC (Esquema Regional de Alívio de Carga) que promove o corte automático de cargas quando ocorre uma perturbação no SIN. E o mais engraçado é que os consumidores que participam do ERAC nem recebem nada por isto.

 

5) E a perseguição às termelétricas é tanta que, até nos leilões de capacidade coloca-se um nível de penalidade para as mesmas, em casos de falhas eventuais, uma penalização das mais expressivas do mundo, enquanto as demais fontes têm penalizações de pequeno porte.

 

E poderíamos listar vários outros exemplos, mas a mensagem aqui é clara: esse “fanatismo verde” não é compartilhado pelos consumidores, em especial os cativos, e isto é facilmente comprovável. É só ver pesquisas de opinião realizadas pela Aneel e pela Abradee.

Então, senhores leitores, não confiem em opiniões fanáticas e sem respaldo técnico. Não deixem que a inconsequência de informações truncadas e absurdas leve vocês a terem que ler aqueles mesmos artigos no escuro. Podem verificar: não tem jeito, o SIN pune quando é mal tratado.

Desta forma, o melhor seria que essa turma que acredita em Papai Noel passasse a tomar conta do sistema elétrico da Lapônia. Lá é tudo um conto de fadas e pode ficar no escuro o tempo todo.

CEO da Abraget, Xisto Vieira

Xisto Vieira, Presidente da Abraget

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