Guilherme Mercês
Foto: Acervo pessoal
Exploração

“O BRASIL NÃO PODE DESPREZAR SUAS RESERVAS DE PETRÓLEO”

Guilherme Mercês, da Aurum Tank, vê papel-chave de hidrocarbonetos no desenvolvimento econômico e na transição energética

REDAÇÃO
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O Brasil é bastante privilegiado quando o assunto é fonte de geração de energia. Além de contar com uma enorme capacidade envolvendo fontes renováveis, há um grande potencial que ainda pode ser explorado e apoiar o processo de transição energética nas próximas décadas. Esse é o diagnóstico de Guilherme Mercês, sócio-fundador da Aurum Tank, consultoria especializada em energia.

Mestre em Economia pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Mercês já participou de diversos programas executivos internacionais de Scenario Planning pela Oxford University, em Investimento Social Privado pela Columbia University e Estratégia pelo INSEAD.

Sua carreira conta com passagens como economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio, Serviços e Turismo (CNC) e da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan). Também foi Secretário de Fazenda do Estado do Rio de Janeiro, cargo no qual acumulou algumas importantes vitórias para a gestão.

“Renegociamos a dívida de royalties e participações especiais durante a pandemia, quando o preço do brent estava inferior a US$ 20, evitando perda de R$ 6 bilhões; fechamos o maior acordo tributário de ICMS da história do estado, encerrando contencioso sobre a tributação de diesel bunker por meio de um convênio aprovado pelo Confaz (Conselho Nacional de Política Fazendária) e que regulamentou o tema no Brasil; também lideramos o processo para que o estado fosse o primeiro do Brasil a implementar o Repetro Industrialização”, destaca Mercês.

Em entrevista ao Valor da Energia, ele faz um diagnóstico sobre o setor de petróleo e gás, destaca o potencial e os desafios da interiorização do seu fornecimento e como a questão do licenciamento ambiental da Margem Equatorial precisa ser resolvida para potencializar a produção nacional.

Como garantir energia acessível, segura e limpa com perspectivas de aumento da demanda em um cenário de restrição de emissões? Qual o papel dos setores de petróleo e gás natural nesse contexto?

O Brasil já se apresenta como um grande hub de energia limpa no planeta. Estamos muito à frente do resto do mundo: quase 50% da oferta interna de energia no país provém de fontes renováveis, contra 14% a nível global. E o custo para a transição energética muito provavelmente será menor aqui.

Ao mesmo tempo, temos um enorme potencial no que diz respeito à produção de gás natural. Há uma forte demanda por esta molécula, e as oportunidades podem ser resumidas em quatro grandes iniciativas: maior monetização das reservas do pré sal, com redução da reinjeção; utilização na indústria em substituição ao diesel e ao óleo combustível; flexibilidade e menor pegada de carbono no setor elétrico brasileiro; e interiorização do fornecimento de gás natural pelo modal rodoviário.

Com isto aumentaríamos a oferta desta importante alternativa para a transição energética. E o petróleo seria o funding para esta transição. A produção nacional vai aumentar 60% até 2032, chegando a 5,3 milhões de barris/dia e fazendo o país saltar do nono para o quarto lugar no ranking dos maiores produtores mundiais.

Considerando apenas o Estado do Rio de Janeiro e seus municípios, a receita com royalties e participações especiais aumentaria 50% até 2030, chegando a R$ 66 bilhões anuais.

Guilherme Mercês

"Estamos muito à frente do resto do mundo: quase 50% da oferta interna de energia no país provém de fontes renováveis, contra 14% a nível global. E o custo para a transição energética muito provavelmente será menor aqui."

Guilherme Mercês

Sócio-fundador da Aurum Tank

Como avalia as recentes mudanças regulatórias no fornecimento de gás natural pelo modal rodoviário? De que forma contribuirão para o aumento da competitividade do segmento?

A interiorização do fornecimento de gás natural rodoviário pode contemplar tanto o gás natural comprimido (GNC) quanto o gás natural liquefeito (GNL), e mudanças regulatórias que estimulem a maior competitividade são sempre bem-vindas. De fato, ainda são muitas indústrias no interior do país que não têm acesso a gás. Mas é importante concluirmos a infraestrutura de escoamento do gás desde os campos offshore. Teremos ainda este ano a conclusão da Rota 3, com capacidade de 18 milhões de m3/dia, ligando os campos do pré sal ao município de Itaboraí (RJ). Também temos a possibilidade de novos gasodutos, ligando os campos produtores a cidades fluminenses, como a Rota 4B, com destino a Itaguaí, a Rota 5B, com destino a Macaé, e a Rota 6B, para São João da Barra.

O petróleo tem sido aclamado como o grande financiador da transição energética. Quais são os desafios a serem superados para que o país aproveite o potencial das reservas existentes? O que outros países têm feito?

O Brasil não pode desprezar suas reservas de petróleo. Em países como Estados Unidos, Noruega e Coreia o aumento do consumo de energia per capita acompanhou o processo de desenvolvimento socioeconômico, por meio da produção e uso de hidrocarbonetos. Já temos uma matriz energética três vezes mais renovável que a média do resto do planeta. Entre 2032 e 2055, caso o país não inicie a exploração de novos campos de petróleo, a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) estima uma a perda de arrecadação de R$ 824 bilhões em impostos.

Além disso, a redução da produção nacional nesse período significa também a redução das participações governamentais, cujos recursos a União, Estados e Municípios podem utilizar em políticas públicas que contemplam a proteção ao meio ambiente. Daí a importância de concretizar a exploração da Margem Equatorial, que hoje está impedida por falta de licenciamento ambiental.

Estudos de volumetria feitos pela EPE, com a consultoria da Geoworks Consulting Services, indicam uma expectativa de volume de 80 bilhões de barris de óleo equivalente nesta região. Ou seja, a abertura desta nova fronteira assegura a produção, as exportações e a nossa autossuficiência nas próximas décadas.

Guilherme Mercês

"Entre 2032 e 2055, caso o país não inicie a exploração de novos campos de petróleo, a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) estima uma a perda de arrecadação de R$ 824 bilhões em impostos."

Guilherme Mercês

Sócio-fundador da Aurum Tank

Como os royalties e participações especiais podem ser o funding para políticas públicas que preparem estados e municípios produtores para um futuro em que o petróleo não estará mais entre as principais fontes de recurso?

Os royalties e as participações especiais teriam a finalidade justamente de preparar estados e municípios produtores de petróleo para um futuro em que este não será mais uma das principais fontes de energia. E dentro deste cenário o Brasil está em posição privilegiada: é uma superpotência energética, rico em recursos naturais, com uma matriz energética, elétrica e de transportes entre as mais renováveis do mundo.

Também podemos ser um protagonista global em biocombustíveis. Todo este contexto permite uma ampla gama de alternativas para a estratégia de nosso país na transição energética. O grande desafio em termos de políticas públicas é utilizar bem esses recursos, e isso significa direcioná-los especialmente para investimentos para transição não só da matriz energética, mas da economia local.

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