SETOR ELÉTRICO DEBATE ADIAMENTO DO LRCAP E USO DE BATERIAS
MME está com consulta pública aberta até 28 de outubro. Especialistas comentam sobre possibilidade de participação de baterias para armazenamento de energia no certame
Até 28 de outubro, o Ministério de Minas e Energia (MME) está com consulta pública aberta para discussão sobre a minuta preliminar da portaria de diretrizes para o Leilão de Reserva de Capacidade na forma de Potência (LRCAP), que traz entre as novidades a contratação de sistemas de armazenamento por meio de baterias. Há pontos do processo que preocupam especialistas, entre os quais a possibilidade de entrada de baterias para armazenamento de energia. Outra questão são as dúvidas sobre o leilão ocorrer ainda este ano ou ser adiado para 2025.
Segundo Marisete Pereira, presidente da Associação Brasileira das Empresas Geradoras de Energia Elétrica (Abrage), para que os requisitos de potência do sistema elétrico sejam atendidos nos próximos anos, é fundamental que o LRCAP de 2024 ocorra até o primeiro trimestre de 2025.
“As decisões para evitar os riscos de déficit de potência nos horários de ponta, previstos a partir de 2027, devem ser tomadas com celeridade, pois a segurança energética é uma prioridade nacional e os projetos de novas unidades geradoras requerem prazos para sua implantação”, destaca Marisete.
Estudos elaborados pela a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) apontam que, a partir de 2027, haverá uma crescente necessidade de oferta adicional para suprir o requisito de potência. A previsão é que essa demanda chegue a 5,5 mil megawatts, em 2028, e alcance 35 mil megawatts no acumulado até 2034.
Conforme a executiva, o LRCAP é essencial para garantir a segurança e a confiabilidade do sistema elétrico, cuja expansão nos últimos anos tem sido realizada quase que exclusivamente por fontes intermitentes. Marisete defende a ampliação da capacidade instalada de usinas hidrelétricas existentes como a melhor solução para atender aos requisitos desse leilão. “Ao aproveitar a infraestrutura já existente das usinas hidrelétricas, os custos para os consumidores tendem a ser mais acessíveis.”
Xisto Vieira Filho, presidente da Abraget, destaca a importância do leilão de capacidade para garantir a segurança eletroenergética. Para ele, o LRCAP foi concebido para dar confiabilidade ao sistema. Ou seja, adequacidade, que é o atendimento da carga 24h/dia; segurança, a capacidade de suportar emergências; e resiliência, a rápida recomposição do sistema. “A confiabilidade é um atributo que nenhum setor elétrico no mundo pode abrir mão, e que é garantido pelas termelétricas e pelas hidrelétricas com reservatório”, pontua.
“Entendemos claramente as dificuldades para a emissão de um processo de LRCAP que atenda a critérios de confiabilidade em um ambiente de transição energética. Mas, enxergamos que o Ministério de Minas e Energia vem tomando medidas adequadas para fazer face a eventuais adiamentos de pequeno porte”, afirma. Como exemplo, ele cita a portaria sobre procedimentos operativos para assegurar despachos de geração termelétrica, se necessário, por parte do Operador Nacional do Sistema em 2025.
Certame com inclusão de baterias para armazenamento de energia
Na avaliação de Luiz Carlos Ciocchi, ex-diretor geral do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), um adiamento de até dois meses no leilão não impacta significativamente no planejamento do setor. No entanto, com o ingresso de fontes intermitentes no certame será necessário que o leilão ocorra anualmente. “Não é o atraso que me preocupa, mas essa rotina que tem que ser estabelecida com essa possibilidade de inclusão de renováveis com sistema de armazenamento”, afirma.
Xisto destaca que a Abraget é favorável a diversidade de fontes na matriz elétrica. No entanto, ele diz que o desafio é saber quais serviços as baterias podem prestar ao sistema. “Para confiabilidade, ou seja, adequação, estabilidade de tensão, angular e frequência, no momento atual, não há possibilidade de utilização de tais equipamentos, uma vez que, a tecnologia dos inversores mais moderno (GFM, grid forming) ainda é considerada em fase experimental para esses fins”, explica.
Ele complementa que países como Estados Unidos, Austrália, China e Reino Unido vêm implementando as baterias GFM, mas ainda faltam análises mais adequadas. Entre os aspectos a serem considerados, na visão de Xisto, estão a perda de vida útil dos equipamentos, corrente de curto-circuito, propagação de oscilação entre subsistemas, velocidade de controle ante velocidade do evento e, principalmente, interações entre controladores eletricamente próximos. “Dessa forma, o leilão de baterias seria perfeito se não fosse associado ao leilão LRCAP, que é um leilão de confiabilidade e não só para atender a ponta”, ressalta o presidente da Abraget.
Na opinião de Marisete, as baterias poderiam participar do Leilão de Reserva de Capacidade de 2025 e não no de 2024. Ela destaca que além das baterias químicas, como as de íon-lítio, há o que ela chama de “baterias de água” – usinas de bombeamento ou hidrelétricas –, que representam mais de 90% de toda a energia armazenada no mundo.
Marisete destaca vantagens das usinas hidrelétricas reversíveis em relação às baterias químicas, entre as quais melhor custo-benefício, maior capacidade de armazenamento e eficiência, vida útil mais longa (geralmente, acima de cem anos) e menos necessidade de manutenção e substituição. Segundo ela, o setor hidrelétrico está pronto para atender à necessidade de mais recursos de potência para o sistema elétrico nos próximos anos com as usinas hidrelétricas reversíveis, com o aproveitamento do potencial brasileiro estimado, em uma avaliação conservadora, em 38 gigawatts.
“O Brasil é uma das maiores potências do mundo em utilização sustentável da energia hidrelétrica e, portanto, domina essa tecnologia, tem profissionais qualificados e toda a cadeia de produção instalada no país”, afirma. “A Abrage defende que o Brasil avance rapidamente na regulação das tecnologias de armazenamento, em especial das usinas hidrelétricas reversíveis, de modo a viabilizar sua participação na matriz elétrica brasileira.”
Leia mais
Entenda o LRCAP
O Leilão de Reserva de Capacidade (LRCAP) é um mecanismo utilizado no setor de energia elétrica para garantir a disponibilidade de energia para atender a demanda futura. O objetivo é assegurar que haja capacidade de geração suficiente para evitar situações de racionamento ou falta de energia.
O LRCAP é um processo de planejamento energético que visa garantir a continuidade do fornecimento de energia elétrica ao Sistema Interligado Nacional (SIN). O LRCAP 2024 é uma resposta à necessidade de contratação de capacidade de potência para atender aos critérios gerais de garantia de suprimento estabelecidos pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE).
O LRCAP 2024 deve ocorrer em 2025. A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) tem a obrigação de divulgar o edital do leilão pelo menos 30 dias antes da realização do certame.